quinta-feira, 25 de março de 2010

A Viúva Velha


A maioria dos negros que vieram para o Brasil, na época da escravidão, eram de Angola. Vale a pena conhecer uma lenda de lá!
Rita Acioli (adaptação de lenda dos chagas, povo de Angola)

Conta-se que há muitos anos, na aldeia dos chagas, tudo era motivo de alegria. Havia muitas crianças e elas faziam a festa na aldeia.
Apenas uma moradora não conhecia a felicidade. Era uma viúva velha, triste e sem filhos, que só tinha um terreno onde cultivava frutas e legumes.
A vidinha da viúva era cuidar da plantação, principalmente das cabaças. Ninguém podia chegar perto delas. O pessoal da aldeia dizia que a velha cuidava das cabaças como se fossem os filhos e netos que não havia tido.
Certo dia, quando estava na plantação, a viúva recebeu um visitante estranho, que disse:
-Cuida bem das próximas quatro cabaças que retirar da terra, pois elas serão os quatro filhos que a senhora nunca teve!
Pensando ser mais uma brincadeira dos aldeões, a velha falou :
-Do que está falando? Como posso dar carinho e cantar canções de ninar para uma cabaça? Por acaso pensa que estou louca?
-Confie em mim! -disse o mensageiro, desaparecendo em seguida.
Meio zonza, a viúva atendeu ao pedido. Recolheu quatro cabaças. As três menores pendurou em casa e, a quarta, que era muito grande, deixou perto do fogo. No dia seguinte, foi ao mercado e deixou a casa sozinha. Como por encanto, as cabaças se transformaram em crianças, que começaram a correr pela casa, brincando na maior felicidade .
O irmão mais velho viu que a casa estava suja e desarrumada. Bem depressa todos começaram a faxina. Deixaram tudo arrumadinho, nos trinques. Assim que terminaram, o irmão mais velho tratou de colocar os mais novos pendurados no alto da casa e se ajeitou ao lado do fogo, voltando a ser cabaça.
Quando a velha voltou viu que algo ,estava diferente. Ficou sem entender. Uma de suas vizinhas, curiosa, perguntou quem eram aquelas crianças que brincavam e trabalhavam em sua casa. A viúva arregalou os olhos e lembrou do mensageiro.
Certo dia, fingindo que ia sair, a velha retornou logo em seguida e viu as crianças.
Ao vê-Ia, elas se assustaram e correram para se pendurar na casa. Antes disso acontecer, a velha disse:
-Esperem! Não se transformem em cabaças. Sejam meus filhos e não meus empregados. Deixem-me amar e cuidar de vocês como se fossem meus filhos!
As crianças, à partir daquele momento, não se transformaram mais em cabaças.
Animadas com tanto carinho, brincavam e trabalhavam felizes ao lado da viúva. Um dia, ela, carregando uma enorme panela cheia de comida, tropeçou no filho mais velho. A panela espatifou-se no chão.
-Quantas vezes eu já disse para não ficar aí, como um vegetal inútil que sempre foi? Não sei porque fico cozinhando para um bando de vegetais como você e seus irmãos! -disse a viúva.
Mal acabou de falar, puf!, as crianças se transformaram em cabaças.
-Voltem, meus filhos, me desculpem! -disse a velha, desesperada.
Eles nunca mais voltaram. Durante muito tempo, quem passasse perto da casa da velha ouvia seu choro e as súplicas inúteis pela volta dos filhos. Dizem que ela viveu o resto de seus dias abraçada às cabaças, infeliz e sozinha.